"Separação"


UM TOQUE ESPECIAL
Separação do ponto de vista emocional da criança
Uma união será sempre uma união. Não importa se ela foi boa ou ruim, se culminou em um rompimento traumático ou não.

Nesse caso, se o casal tiver filhos, as consequências e responsabilidades se ampliam e envolvem “outras vidas”, como avós, tios, primos, amigos e todas as pessoas de certa forma ligadas à relação.

Podemos imaginar que, em momentos de fúria, nada mais importa, a não ser destilar o fel da raiva e da decepção sentida um pelo outro.

Porém não se deve esquecer que, dois seres transformaram-se em um pai e uma mãe, com o dever de zelarem pela integridade física e mental dos filhos.

Todas as pessoas em torno do casal continuarão existindo, tendo que lidar com angústias e com momentos difíceis.

Poucas pessoas estão dispostas a encarar seus problemas de frente, sem se valerem de subterfúgios e escapes, com o objetivo de não se falar a respeito daquilo que mais incomoda.

A criança é um alvo muito fácil perante as dificuldades dos adultos em falarem a respeito daquilo que ninguém diz, mas tem muita vontade de dizer. Ela, muitas vezes, é usada para falar aquilo que o adulto não tem coragem de dizer a outro adulto. Muitas vezes esses adultos são seus familiares e, por mais que se imponham às crianças, elas continuam tendo idéias próprias a respeito deles. Pelo menos deveriam ter, ou serem estimuladas nessas idéias e não manipuladas em seus pensamentos.

A criança deve ser respeitada para poder aprender a respeitar também. Se os pais não se entendem entre si, muitas vezes não entendem a si próprios. Imagine só o que se passa pela cabeça de uma criança, no meio de tanta desordem. Os pais podem ser responsáveis no plano jurídico, no plano da educação moral, mas não podem responder a tudo. Aliás, alguém pediu a aprovação dessa criança no momento da separação? Sua vida não pode ser um “pingue-pongue” nas mãos de poderosos adultos que dizem por elas palavras que nem ousariam pensar, que a cerceiam de estar com as pessoas tão íntimas, próximas, que fizeram parte do seu pequeno universo.

Um adulto consciente deve repensar seus valores, pesar as conseqüências de seus atos e ter a humildade de saber se será capaz, neste momento, de lidar, de uma forma menos destrutiva, com suas emoções, sem que façam mal tanto a si próprio, quanto às pessoas que compartilham sua vida e a de quem devem educar.

Adulto e criança possuem visões diferentes. É que os pensamentos dos pequeninos não se sucedem de modo ordenado como os do adulto e, se este, por sua vez, insistir que seu modo de ver as coisas é o correto – como até pode ser, visto pela ótica do adulto – a criança se sentirá só e desesperançada no seu caminho.

Quando uma criança tenta entender-se e entender os outros, ou imaginar as conseqüências possíveis e específicas de alguma ação, acaba desenvolvendo fantasias que preocupam sua mente em torno destes resultados.

Se o adulto ajudar a manter estes monstros dentro da criança, sem falar deles, ou escondidos no inconsciente dela, irão impedi-la de elaborar as fantasias mais primitivas de sua mente. Sem tais fantasias, a criança não consegue conhecer melhor seu mundo interno, nem recebe sugestões sobre a forma de conseguir entendê-lo. Em conseqüência, fica impotente face às suas ansiedades.

Piaget descreve como uma criança de menos de quatro anos perguntou-lhe sobre as asas do elefante. Ele replicou que os elefantes não voam. Ela insistiu: “voam sim, eu vi”. A menininha obviamente estava lutando com algum problema, e as explicações factuais não serviram para nada, pois não se dirigiram ao problema.

Se Piaget tivesse entabulado uma conversa sobre a pressa do elefante em voar, ou sobre os perigos dos quais o elefante estava tentando escapar, as proposições a que a criança estava se aferrando emergiriam, porque Piaget teria demonstrado sua boa vontade em aceitar o método dela explorar o problema.

Pais sensatos procuram ouvir seus filhos, observá-los e apoiá-los. Afinal, todos estão inalando o mesmo ar, estão juntos e se separando juntos também. As crianças constroem através de seus recursos e de uma forma muito mais desprotegida. Utilizam mecanismos próprios de ajuda para um momento de tamanha dor mental como este.

Cabe aos pais cuidarem dessa criança, fazendo o possível para acompanhá-la no seu sofrimento. Estarem perto já é o bastante. E custe o que custar, poupá-la de um mundo adulto incompreensível para elas, já que nem os adultos, muitas vezes, conseguem entendê-lo e suportá-lo.

Em determinados casos, os pais deveriam ter a humildade e coragem de perceberem-se inaptos para lidarem com certas situações. Neste momento, pensando na responsabilidade que possuem em relação a futura formação da vida emocional e afetiva de seus filhos, deveriam procurar ajuda psicológica.

Dizer-lhes onde se enraíza seu saber sobre si mesmo e sobre seu valor para quem o ama e garante sua educação, independente das turbulências que possam ocorrer durante o percurso de sua existência. Essa é uma forma de garantir-lhes a segurança mínima para seus passos titubeantes de agora.

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